sábado, 19 de março de 2011

O PRIMEIRO AMOR

Gosto muito de passear por blogs alheios. 

Ao lê-los por vezes parece que acabo lendo-me neles...

E hoje, em um desses gratos passeios, encontrei o texto mais belo, sublime e verdadeiro que já tive a oportunidade de ler.

O texto chama-se "O Primeiro Amor" e está postado originalmente no excelente blog "Intensidade" (http://souintenso.blogspot.com/2011/03/sem-palavras-vale-pena-ler.html).
Compartilho, portanto, com vocês e afirmo que vale a pena cada minuto investido na leitura



O PRIMEIRO AMOR

É fácil saber se um amor é o primeiro amor ou não. Se admite que possa ser o primeiro, é porque não é; o primeiro amor só pode parecer o último amor. É o único amor, o máximo amor, o irrepetível e incrível e antes morrer que ter outro amor. Não há outro amor. O primeiro amor ocupa o amor todo.

Nunca se percebe bem por que razão começa. Mas começa. E acaba sempre mal só porque acaba. Todos os dias parece estar mesmo a começar porque as coisas vão bem, e o coração anda alto. E todos os dias parece que vai acabar porque as coisas vão mal e o coração anda embaixo.

O primeiro amor dá demasiadas alegrias, mais do que a alma foi concebida para suportar. É por isso que a alegria dói - porque parece que vai acabar de repente. E o primeiro amor dói sempre demais, sempre muito mais do que aguenta e encaixa o peito humano, porque a todo o momento se sente que acabou de acabar de repente. O primeiro amor não deixa de parte um único bocadinho de nós. Nenhuma inteligência ou atenção se consegue guardar para observá-lo. Fica tudo ocupado. O primeiro amor ocupa tudo. É inobservável. É difícil sequer refletir sobre ele. O primeiro amor leva tudo e não deixa nada.

Diz-se que não há amor como o primeiro e é verdade. Há amores maiores, amores melhores, amores mais bem pensados e apaixonadamente vividos. Há amores mais duradouros. Quase todos. Mas não há amor como o primeiro. É o único que estraga o coração e que o deixa estragado.
É como uma criança que põe os dedos dentro de uma tomada eléctrica. É esse o choque, a surpresa «Meu Deus! Como pode ser!» do primeiro amor. Os outros amores poderão ser mais úteis, até mais bonitos, mas são como ligar eletrodomésticos à corrente. Este amor mói-nos o juízo como a Moulinex mói café. Aquele amor deixa-nos cozidos por dentro e com suores frios por fora, tal e qual num microondas. Mas o «Zing!» inicial, o tremor perigoso que se nos enfia por baixo das unhas e dá quatro mil voltas ao corpo, naquele micro-segundo de eletricidade que nos calhou, só acontece no primeiro amor.

O primeiro beijo é sempre uma confusão. Está tudo a andar à volta e não se consegue parar. A outra pessoa assalta-nos e deixa-nos tontos, isto apesar de ser tão tímida e inepta como nós. E os nomes dos nossos primeiros amores? Os nomes doem. Parecem minúsculos milagres. Cada vez que se pronunciam, rebenta um pequeno terramoto no Equador. E as mãos? Quando a mão entra na mão de quem se ama e se sente aquele exagero de volts e de pele, a única resposta sensata é o assassínio, o exílio, o suicídio. Nada fica de fora. O mundo é uma conspiração cinzenta de amores em segunda mão. Nada é puro fora daquelas mãos. O tesouro está a arder, as pessoas estão a morrer, os olhos cheios de luz estão a cegar, mas o primeiro amor é também, e sem dúvida, o primeiro amor do mundo.

O primeiro amor é aquele que não se limita a esgotar a disposição sentimental para os amores seguintes: quer esgotá-la. Depois dele, ou depois dela, os olhos e os braços e os lábios deixam de ter qualquer utilidade ou interesse. As outras pessoas - por muito bonitas e fascinantes que sejam - metem-nos nojo. Só no primeiro amor. 

Não há amor como o primeiro. Mais tarde, quando se deixa de crescer, há o equivalente adulto ao primeiro amor - é o primeiro casamento; mas não é igual. O primeiro amor é uma chapada, um sacudir das raízes adormecidas dos cabelos, uma voragem que nos come as entranhas e não nos explica. Eletrifica-nos a capacidade de poder amar. Ardem-nos as órbitas dos olhos, do impensável calor de podermos ser amados. Atiramo-nos ao nosso primeiro amor sem pensar onde vamos cair ou de onde saltamos. Saltamos e caímos. Enchemos o peito de ar, seguramos as narinas com os dedos a fazer de mola de roupa, juramos fazer três ou quatro mortais de costas, e estatelamo-nos na água ou no chão, como patos disparados de um obus, com penas a esvoaçar por toda a parte.

Há amores melhores, mas são amores cansados, amores que já levaram na cabeça, amores que sabem dizer «Alto-e-pára-o-baile», amores que já dão o desconto, amores que já têm medo de se magoarem, amores democráticos, que se discutem e debatem. E todos os amores dão maior prazer que o primeiro. O primeiro amor está para além das categorias normais da dor e do prazer. Não faz sentido sequer. Não tem nada a ver com a vida. Pertence a um mundo que só tem duas cores - o preto - preto feito de todos os tons pretos do planeta e o branco - branco feito de todas as cores do arco-íris, todas a correr umas para as outras.

Podem ficar com a ternura dos 40 e com a loucura dos 30 e com a frescura dos 20 - não outro amor como o doentio, fechado-no-quarto, o amor do armário, com uma nesga de porta que dá para o Paraíso, o amor delirante de ter sempre a boca cheia de coração e não conseguir dizer outra coisa com coisa, nem falar, nem pedir para sair, nem sequer confessar: «Adeus Mariana - desta vez é que me vou mesmo suicidar.» Podem ficar (e que remédio têm) com o savoir-faire e os fait-divers e o «quero com vista pró mar se ainda houver». Não há paz de alma, nem soalheira pachorra de cafunés com champagne, que valha a guerra do primeiro amor, a única em que toda a gente morre e ninguém fica para contar como foi.

Não há regras para gerir o primeiro amor. Se fosse possível ser gerido, ser previsto, ser agendado, ser cuidado, não seria primeiro. A única regra é: Não pensar, não resistir, não duvidar. Como acontece em todas as tragédias, o primeiro amor sofre-se principalmente por não continuar. Anos mais tarde, ainda se sonha retomá-lo, reconquistá-lo, acrescentar um último capítulo mais feliz ou mais arrumado. Mas não pode ser. O primeiro amor é o único milagre da nossa vida - e não há milagres em segunda mão. É tão separado do resto como se fosse uma primeira vida. Depois do primeiro amor, morre-se. Quando se renasce há uma ressaca. É um misto de «Livra! Ainda bem que já acabou!» e de «Mas o que é isto? Para onde é que foi?».

Os outros amores são maiores, são mais verdadeiros, respeitam mais as personalidades, são mais construtivos - são tudo aquilo que se quiser. Mas formam um conjunto entre eles. O segundo e o terceiro e o quarto, por muito diferentes, são mais parecidos. São amores que se conhecem uns aos outros, bebem copos juntos, telefonam-se, combinam ir à Baixa comprar cortinados. O primeiro amor não forma conjunto nenhum. Nem sequer entre os dois amantes - os primeiros, primeiríssimos amantes. Acabam tão separados os dois como o primeiro amor acaba separado dos demais. O amor foi a única coisa que os prendeu e o amor, como toda a gente sabe, não chega para quase nada. É preciso respeito e bláblá, compreensão mútua e muito bláblá, e até uma certa amizade bláblá. Para se fazer uma vida a dois que seja recompensadora e sobretudo bláblá, o amor não chega. Não se vive só dele. Não se come. Não se deixa mobiliar. Bláblá e enfim.

Mas é por ser insustentável e irrepetível que o primeiro amor não se esquece. Parece impossível porque foi. Não deu nada do que se quis. Não levou a parte nenhuma. O primeiro amor deveria ser o primeiro e esquecer-se, mas toda a gente sabe, durante o primeiro amor ou depois, que é sempre o último.

Afinal nem é por ser primeiro, nem é por ser amor. A força do primeiro amor vem de queimar - do incêndio incontrolável - todas aquelas ilusões e esperanças, saudades pequenas e sentimentos, que nascem em nós com uma força exagerada e excessiva. Como se queima um campo para crescer plantas nele. Se fôssemos para todos os outros amores com o coração semelhantemente alucinado e confuso, nunca mais seríamos felizes. É essa a tristeza do primeiro amor. Prepara-nos para sermos felizes, limando arestas, queimando energias, esgotando inusitadas pulsões, tornando-nos mais «inteligentes».

É por isso que o primeiro amor fica com a metade mais selvagem e inocente de nós. Seguimos caminho, para outros amores, mais suaves e civilizados, menos exigentes e mais compreensivos. Será por isso que o primeiro amor nunca é o único? Que lindo seria se fosse mesmo. Só para que não houvesse outro.
(Miguel Esteves Cardoso)






Angel

Sarah McLachlan

Spend all your time waiting
For that second chance
For a break that would make it okay
There's always some reason
To feel not good enough
And it's hard at the end of the day
I need some distraction
Oh beautiful release
Memories seep from my veins
Let me be empty
Oh and weightless and maybe
I'll find some peace tonight

In the arms of the angel
Fly away from here
From this dark cold hotel room
And the endlessness that you feel
You are pulled from the wreckage
Of your silent reverie
You're in the arms of the angel
Maybe you find some comfort here

So tired of the straight line
And everywhere you turn
There's vultures and thieves at your back
And the storm keeps on twisting
You keep on building the lies
That you make up for all that you lack
It don't make no difference
Escaping one last time
It's easier to believe in this sweet madness oh
This glorious sadness that brings me to my knees

In the arms of the angel
Fly away from here
From this dark cold hotel room
And the endlessness that you feel
You are pulled from the wreckage
Of your silent reverie
You're in the arms of the angel
Maybe you find some comfort here
You're in the arms of the angel
Maybe you find some comfort here


Anjo

Sarah McLachlan

Gaste todo seu tempo esperando
Por aquela segunda chance,
Por uma mudança que resolveria tudo
Sempre há um motivo
Para não se sentir bom o bastante,
E é difícil no fim do dia.
Eu preciso de alguma distração.
Oh, perfeita liberação
A lembrança vaza de minhas veias...
Deixe-me vazia
E sem peso e talvez
Eu encontrarei alguma paz esta noite.

Nos braços de um anjo,
Voe para longe daqui,
Deste escuro e frio quarto de hotel
E da imensidão que você teme.
Você é arrancado das ruínas
De seu devaneio silencioso.
Você está nos braços de um anjo,
Talvez você encontre algum conforto aqui

Tão cansado de seguir em frente,
E para todo lugar que você se vira
Existem abutres e ladrões nas suas costas,
E a tempestade continua se retorcendo.
Você continua construindo a mentira
Que você inventa para tudo que lhe falta
Não faz nenhuma diferença
Escapar uma última vez.
É mais fácil acreditar nesta doce loucura, oh
Esta gloriosa tristeza que me faz ajoelhar.

Nos braços de um anjo,
Voe para longe daqui,
Deste escuro e frio quarto de hotel
E da imensidão que você teme.
Você é arrancado das ruínas
De seu devaneio silencioso.
Você está nos braços de um anjo,
Talvez você encontre algum conforto aqui
Você está nos braços de um anjo.
Talvez você encontre algum conforto aqui



  

4 comentários:

  1. Seja sempre bem vinda à Ilha. Que você possa aportar no meu cantinho, pra descansar seus olhos, sempre que tiver vontade. Beijos.. :)

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  2. Olá Guilherme!
    Obrigada pelo carinho! Sinta-se em casa por aqui também, viu? Abraços, Déia

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  3. Genteeee que coisas linda!!! Esse faço questao de ir pessoalmente comentar!!!

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  4. Lindo, né, Cami? Espero que o autor nao se importe por eu ter postado aqui...Afinal, tem os devidos creditos... Que bom que vc gostou! Bjs amada! Deia

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"Onde eu não estou
as palavras me acham."
Manoel de Barros

Olá! Fico muito feliz pela sua visita! Responderei ao seu comentário por aqui, portanto volte logo, sim?
Um abraço apertado a todos que por aqui passarem!
Déia
PS: Não esqueça de deixar o link do seu blog no Mural de Devaneios (Mural de Recados) para que eu possa retribuir sua visita.

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